terça-feira, 13 de janeiro de 2009

COLINHO DE MÃE É BOOOOOOOOOM!!!

Voltar pra casa... Bom, no meu caso, voltar para as casas. Porque ultimamente no RJ, tenho potencialmente 4 casas pra ficar. Só que quando chego em alguma delas, acabo me acostumando e a preguiça não me deixa viver em migração, de casa em casa.

Agora, casa mesmo, dizem, está dentro da gente. Vai ver é por isso a descomunal importância dada pelos psicanalistas àqueles desenhinhos de casa que as crianças tanto fazem, variando o jardim (mais ou menos florido), o céu (com nuvens e sol ou lua ou chovendo), a presença, ausência, boa formação ou deformação de integrantes da família (parte da representação mais adorada e interpretada pelos profissionais da mente).

Como moramos em dois prédios de número 152 na minha infância, era mais ou menos assim que eu desenhava a minha. Era não, é, porque a minha falta de destreza com as linhas, perspectivas e preenchimentos faz com que, mesmo com ajuda tecnológica, minha casa seja até hoje, com pequeníssimas variações, assim representada:


Toda essa enrolação é só pra dizer que reencontrei inesperadamente um de meus íntimos lares quando fui passar o final de ano em família. Devido a contigências da vida, há muito tempo não ia pra lá ficar mais tempo, como fui agora. E foi uma surpresa o reencontro com uma casa que morei durante 1 ano e meio, cuja dona é uma mulher retada, minha mãe. Ali naquele espaço de muitos tempos reunidos num só, tive a oportunidade de reencontrar também Lina Lucia: choramos e rimos, fizemos muita fofoca e sobretudo, tenho certeza, nos fortificamos juntas, mulheres frágeis e fortes que somos, graças a todos os deuses.

Nossa, quando penso em uma única palavra para traduzir o que é minha mãe, só me vem emoção. Para o bem e para o mal, né? Tudo em minha mãe é excessivo e acho que ela fala muito (assim como eu), porque tem muita, muita coisa mesmo dentro dela. De minha mãe aprendi o lúdico... Acho que ninguém teve uma infância mais fantasiosa do que eu e minha irmã. Fazíamos canastrinha e até a ajuda em casa era algo ligado ao mundo da fantasia, porque trabalhávamos em troca de presentes (balinhas, fofoletes, caixinhas, bijouxs e grana mesmo - eu mesma tinha um bolão de notas de 1 cruzeiro, sempre maior que o da minha irmã) para encher nossas caixinhas que ficavam guardadas embaixo da cama. De tempos em tempos, ela, junto com a gente, encapava com diferentes papéis nossas caixas de sapato mágicas, que sempre tinham as tradicionais fivelas de baú, feitas de papel bem dourado. Ao passar pela Av. Brasil, minha mãe nos distraía com a paisagem para não brigarmos, por isso, para mim, o lindo prédio da Fundação Oswaldo Cruz foi até meus 10 anos mais ou menos o castelo da Branca de Neve ou da Cinderela, já que ela ia mudando as histórias. Que tal? Em muitos momentos de nossa passagem da infância para a adolescência foi difícil sair desse mundo imaginário, mas hoje vejo o quanto ele foi importante, pois fez guardar dentro de mim uma menina, sempre encantada com pequenas e grandes coisas que vejo no mundo.

O senso de que todos são iguais, de que não há, em essência, ser humano melhor ou pior também vem dela. Não que ela falasse diretamente, mas dava condições pra gente se defender de quem nos menosprezasse por qualquer motivo (principalmente racial, não posso deixar de dizer) e destruía logo as idéias de que as pessoas eram superiores ou inferiores, pela maneira de se relacionar com os mais diferentes tipos de pessoas. No colégio, muitas vezes intercedi em quiprocós que envolviam discriminação justamente por isso. Lembro de uma vez uma amiga chegar chorando na sala porque um menino a tinha chamado de crioula. Eu, uma fedelha, disse: "Pára de chorar, levanta essa cabeça, você é criola mesmo e qual é problema? Nenhum. Se você mostrar pra ele que não tem medo de ser criola, ele nunca mais vai achar que estará te xingando te chamando disso." Minha amiga ficou me olhando estática, porque, clarinha como era, acho que esperava que a acalmasse, dizendo que era branca.

Da minha mãe devo também uma amplitude de mundo. Uma professora do município do RJ sempre empenhada na educação de seus três filhos não podia restringir a vida educacional à escola. Então fizemos piano, dança (de ballet ao afro, até mesmo meu irmão fez, para susto de seus colegas de rua), natação, inglês (até quando eu fui reprovada e resolvi não voltar mais), canto, e outros cursos. Apesar de não ter seguido nada disso, foram fundamentais, sobretudo para perceber que, para além dos chatos muros da escola, havia um mundo pensante, intenso e muito, muito interessante.

A força de minha mãe para trabalhar na escola e depois em casa está comigo tenho certeza. Sua renda-extra vinha de trabalhos que ela fazia em casa mesmo. Teve a fase dos congelados, depois dos chocolates - nossa, a sala cheia de bombons coloridos dos mais diferentes sabores - das bijouterias (que até hoje ela faz) e milhares de outras coisas que ela vendia para complementar a renda, garantir o sustento da casa e a nossa tão esperada viagem de férias. Quase sempre para Itaparica - terra de meu avô, onde ela nasceu, tendo ficado lá só até os 7 meses.

Acordávamos 4:00 da manhã - ela, eu, minha irmã, meu irmão bem pequeno - fazíamos uma oração de proteção, guardávamos nossa gigante bagagem e íamos. Geralmente, víamos o amanhacer do dia da Ponte Rio-Niterói. Só ela dirigia pelos 1750 Km que separavam o RJ das imediações de Salvador. Durante o trajeto, cantávamos, brigávamos, contávamos piadas, víamos paisagens, porque tudo na estrada era uma história para minha mãe (O Dedo de Deus, o Frade e a Freira, as plantações, a pobreza da região do cacau). Parávamos para dormir e para telefonar para Leli, que, de casa, tal qual um operador de vôo, guiava nossos passos por rodovias brasileiras. Se hoje um dos meus maiores prazeres é pegar estradas, devo a esses janeiros maneiros que nossa mãe nos proporcionava.

Por tudo isso, que durante os tumultuados dias que passei no RJ, tomados por problemas das mais diferentes ordens, estar na alegre casa de minha mãe foi um grande conforto. Tanto que um dia, ao chegar lá, fiquei estática na entrada, olhando emocionada para a sala de paredes amarelas de minha mãe (tal qual os mini-azulejos que davam o tom da casa constantemente amanhecendo de meus avós, em Guadalupe). Ali, embevecida com os milhares de enfeites espalhados por mesinhas e estantes, com a janela branca composta por uma cortina rendada de boneca, que dá um ar de mundo mágico, pensei: "isso tudo aqui, que reúne também várias histórias de mim, me constitui. Pra onde for, levarei todas essas cores e esses milhares de bibelôs". Levarei também, dentre outras milhares de coisas, o maravilhoso gosto da carne assada com recheio de lingüiça que só ela sabe fazer.

No fundo, sempre saquei a casa de minha mãe para me confortar. Em momentos de profunda dor, seja onde estiver, é para aquela colorida sala de badulaques que vou... Lá é, literalmente, o colinho quente dela. Na verdade mesmo, meu verdadeiro lar.

Mamitaaaaaa, te amo!

12 comentários:

Unknown disse...

Fafi,isso é Croclyn puro.rsrs Colo de mãe é sempre bom.Ler seus textos me fazem bem naqueles dias de saudosismo,faz bem a alma.Agente ri,chora,viaja.Estou no aguarde do Best seler autografado.rsrs Bjão PAZ

Wilson disse...

Fabi, Fabi...

Tô pagando mico aqui no trabalho, minha linda... mas não vou me dobrar não... tô indo (agora) ao banheiro lavar o rosto... ai ai...

Beijão!

PS. mas é pra Dona Lina, tá!

:: Soul Sista :: disse...

Renato, que bom que vc gosta dos textos e que maravilhoso que vc viu Crooklyn na minha homenagem a mamita - rsrsrsrsrsrsrsrs. Mas de fato, se me identifiquei com o filme de Lee é porque gosto muito da abordagem ingênua e crítica ao mesmo tempo, que ele faz da infância. Sobre best-seller, vc ta viajando, né? rsrsrsrsrsrsrs Grande beijo

:: Soul Sista :: disse...

Wilson, querido! Eu fiquei emocionada de cá com o seu comentário... Aliás, se torcermos este blog aqui... vai sair muita lágrima, né? Que blog mais meloso é este? Vou colocar uns textos sérios ou piadas, pra não ficar só no clima do eu, eu, meus sentimentos, e tal... rsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrs
Eu tento ser intelectualizada aqui, quase que meio acadêmica, mas não consigo. Daí fica essa melosidade toda.
Não se dobra mesmo não. A gente chora sim... mas depois lavamos o rosto e voltamos lindos - rsrsrsrs
Um grande beijo

Anônimo disse...

"Fafazinha, caramba!
Como sabe, já enviei comentário, mas algo saiu errado e não postou.
Talvez o primeiro tenha sido diferente desse, mas obrigada pela "mulher retada" (muita gente me vê assim rs rs rs)mas obrigada mesmo por reconhecer minha fragilidade. Isso pra mim é ótimo porque todos só me veem como "fortona" e isso me assusta e incomoda. Sou frágil sim, sou mulher, sou humana.
Acho o mundo infantil muito mágico e único e por isso alimentei tantas fantasias em vocês. Faço isso hoje com a Morena. Nunca abandone a sua menininha, o seu lado infantil. Cuide dela com muito carinho e se permita errar, sem se cobrar a perfeição e a fortaleza.
O que fiz por vocês três foi para torná-los pensantes e críticos como são. Lembra dos comícios do Lula?
As aulas de geografia. história, sociologia e política que tarnsformavam nossas viagens foram herança do meu pai. Ele fazia assim com tudo e isso me deu uma vasta cultura e uma visão incrível do mundo e da sociedade. Quis fazer o mesmo com vocês. Esse é o diferencial da nossa pequena família: a cultura geral.
Essa alegre casa é sua e sempre será. Essa mãe lutadora também.
Você tem muito de mim: a garra, a risada, a alegria, a coragem, o bom humor e as muitas coisas internas. Também te amo e te admiro. Beijos."

Nino disse...

Ai, ai!
Nada a declarar...
Bjs!

Anônimo disse...

Ai, ai!
Sem comentários...
Bjs1

Anônimo disse...

Fá, estou aqui na casa de sua mãe. Acabei de ler o texto e estou aos prantos. Muito lindo!! Sua mãe linda, encantadora.
Beijo grande!

:: Soul Sista :: disse...

Ti di, a mais nova tia-dinda do Brasil,
Ai ai digo eu...
Aqui é justamente um espaço para fazer comentários... Comente então, comente... rsrsrsrsrrsrsrsrsrsrsrsrs

Bjinssssss

:: Soul Sista :: disse...

Ju, que bom que vc se emocionou. Que bom...
Eu juro que não tenho a intenção de levar ninguém às lágrimas, mas só a intenção de abrir para mim mesma alguns canais de comunicação com as minhas emoções. Por isso, esses escritos que tenho feito aqui têm sido tão reveladores... Mas, quando acabo de escrever, fico pensando o quanto tudo está muito emocional demais... rsrsrsrrsrsrs
Um hora, cançarei desse melodrama todo. Por ora, é ele que tem me movido aqui...

Grande beijo, prima!

:: Soul Sista :: disse...

Mamita, sobre o seu comentário, só digo uma coisa...
Sem comentários... rsrsrsrsrs
Bjs

Unknown disse...

Fabi, tenho que entrar nessa e não precisa se ocupar de me responder.
É que você reconheceu publicamente o que sua mãe representa para você (e também seus irmãos): alta competência e proteção como mãe, dedicação a vocês sempre e intensamente.
Você sabe que sempre alertei aos três para que não a julgassem, a permitissem errar (na visão de vocês, claro)sem condená-la no entanto. E, acima de tudo, que não desperdiçassem tempo em vida e aproveitassem todas as oportunidades para desfrutá-la.
Sempre lhes disse que mãe é única, dádiva perene concedida por Deus aos filhos. Assim, boa sorte a vocês e feliz e merecida convivência entre vocês.
Walfredo